Análises

Zelda Skyward Sword

O novo Zelda Skyward sword é um jogo estranho de julgar, difícil pelo marco que representa para uma série acusada de ser estagnante (na opinião do escritor deste artigo, longe disso) e formulaica. Mas a verdade é que por injusta que a bitola fosse, os Zeldas tendem a ser como qualquer IP estabelecido que quando inova, inova em parte, pois o que torna a série distinguível não pode estar sempre a ser re-inventado (por vezes, não pode ser reinventado de todo, como é a história da velocidade nos Sonics) e reinventar a roda sem razões para tal nunca faz sentido.

E os Zeldas, como o Ocarina of Time provou este ano, ao ser re-editado 12 anos depois com a mesma mecânica e estrutura, não têm envelhecido assim tanto nas suas estruturas desde o Zelda: Link to the Past em 1991. É claro, no entanto, e sem transformar isto numa análise ao mesmo, que o Ocarina of Time foi ultrapassado pelos zelda’s subsequentes e não é que isso não se note, especialmente no planeamento e balanceamento das masmorras, mas a verdade é que as bases que este estabeleceu em 1998, não estão terrivelmente desactualizadas, e é por isso que o Ocarina of Time é importante para esta review, porque estamos a rever o primeiro Zelda desde 1998 que ousa funcionar como contra-resposta ao mesmo.

 

Estruturalmente, o overworld como o conhecemos foi abolido, e os “caminhos” passaram a ser mini-masmorras, a precisarem de ser desvendadas e com objectivos integrados na quest. Enquanto que anteriormente estávamos a falar de caminhos cuja incapacidade de avançar se prendia pela ausencia de itens a serem adquiridos em masmorras noutros sitios, neste os itens são frequentemente obtidos nesse espaço, e a progressão e navegação do espaço prendem-se por desvendar o espaço. A navegação por eles não é estática, ao longo do jogo há coisas que se alteram neles e há sempre atalhos que se abrem permitindo um deslocamento mais rápido de ponto A a B.

Isto pode parecer daquelas coisas que pouco enriquecem o jogo, tornar os acessos em espaços mais relevantes, mas a verdade é que torna o jogo muito mais cheio de vida, e torna o level design bem mais complexo. Se antes fazer 7 masmorras dava trabalho, imagino que a maior parte do processo de desenvolvimento deste jogo foi investido no planeamento destes espaços.

A tentativa de fazer algo assim, e de integrar mais as masmorras no espaço circundante não é nova, e foi tentada no Twilight Princess por via da integração/diluição de fronteiras tão óbvias no Forest Temple (a masmorra em questão tinha espaços que pareciam abertos e permitia ver o céu/experiênciar vento/navegação por vento) e há uma quest integrada que leva a ele, mas acabaram por ser experiencias mais superficiais, que por falta de tempo e conservadorismo não foram levadas ao seu auge e mais tarde no jogo somem-se no meio da boa direcção artistica, tal não sucede no SS, e apesar do espaço mais revisitado (o manifesto da ideia, suponho) ser o primeiro, nunca se torna entediante por isso, pela navegação inteligente.

Ainda nos defeitos a serem apontados ao Twilight Princess, era notável a falta de papel na história que todas as personagens tinham na plot, e o facto de personagens contidas na única “sidequest” principal do jogo não terem backgrounds ou sidequests associadas. Esse problema deveu-se ao facto de Hyrule Castle Town ter sido implementada demasiado tarde no jogo (no ultimo adiamento do jogo, as screenshots lançavam uma Hyrule Town numa fase totalmente embrionária) e é com felicidade que constato que o mesmo erro não foi cometido neste Zelda. É uma pena, que a cidade não seja mais vasta e tenha mais sidequests (ainda não é desta que o Majora Mask é superado) mas nenhuma personagem é “ inútil” ou existe sem ter relação com alguém. 

Os controlos são também novos, de raiz e algo que passa o jogo a subjugar as nossas expectativas, toda a gente quando vê uma skulltulla irá ficar especado à espera que ela se vire, e muitos dos bosses, o seu processo de desmantelamento está mais dependente de entender o puzzle do que propriamente força bruta. Eles esperam.

Há espaço para melhorias, muitos irão pedir a dificuldade/adrenalina das batalhas finais do jogo ao longo de todo um zelda (assim como a dificuldade do Majora Mask pode ser dito que começa onde a do OoT terminou), e muitos constatarão que a solução do PSMove, com o dispositivo de posicionamento “luminoso” daria melhores resultados melhores no posicionamento constante do wiimote que vai tendo de ser recalibrado ocasionalmente (o wiimote é melhor para aiming, menos bom com motionplus para 1:1, quando o comando excede x angulo este deixa de captar a luz IR da sensor bar e se passar muito tempo sem retomar essa ligação fica sem saber onde está, tendo de ser recalibrado) não é nada de mais, mas é um ponto em que futuras encarnações do wiimote podem evoluir, tornando a experiencia mais perfeita ainda. Não para dizer que estas recalibrações (frequentemente feitas com a tecla direccional “baixo”) incomodem por aí além, mas se alguma coisa é a constatação de que o conceito pode ir mais longe e melhorar.

 

Outras oclusões “sentidas” é a ausencia do controlo directo 360 graus da câmara (também presente no Zelda TP versão wii), o facto de não se poder andar e manusear a espada em simultaneo nem haver Back Slice (Back slice é a acção de cambalhota lateral com finisher efectuada durante o lock on, que permitia atacar no fim e tinha vantagens ofensivas e defensivas, também tornava as batalhas mais dinâmicas no que toca às acções de straffe) outras hidden skills do TP não regressam, mas parecem opcionais ao lado desta. A questão é que todas estas comodidades, são passíveis de serem re-implementadas em Zeldas com esta control scheme como base, não se tratam de algo equiparável ao beam attack nos Zeldas 2D e como este não faz sentido num Zelda 3D.

Os items são bons e muitos dos “inéditos” estão disponíveis desde cedo no jogo, é refrescante não ter upgrades de itens por equipamento melhor e/ou incremento de capacidade de armazenamento de munições nos upgrades “in-game” em espaços e templos exploráveis, passando a ser feitos na oficina de Sky Town mediante o jogador preencher os requisitos de itens a serem dados em troca necessários. O sistema de escudos em particular é bastante bom apesar de certos escudos não chegarem a ser necessários (o melhor escudo de madeira só o tive depois de ter escudos de ferro). A nova navegação de itens faz sentido, embora, de novo, calcule que possa e possa ser expandida em encarnações futuras, não imagino como poderiam ser implementadas setas de fogo, gelo e luz neste jogo, por exemplo.

Falar em itens voláteis é falar do balanceamento de dinheiro e enquanto que no TP o dinheiro era tão fácil de arranjar que até nos era dado um fato que concedia invencibilidade a troco de queimar as nossas economias como unica forma de as depletar/dar uso, no SS há um fluxo constante de coisas a comprar e razões pelas quais o dinheiro nos faz falta. Se as sidequests forem feitas também há um fluxo constante do incremento de capacidade (ao ponto de que ter/poder ter essa quantidade nem faz sentido) pelo que nunca nos vemos na situação do OoT de estarmos constrangidos pela carteira que temos, incapazes de fazer mais dinheiro.

 

O aspecto técnico, é o factor mais subpar do jogo, não para dizer que o jogo não é bonito, mas enquanto que o TP lutava contra as limitações da gamecube este jogo não luta contra limitações algumas, aceita-as e reaproveita a engine e estrutura implementada dos dois jogos anteriores, isso faz com que começe a mostrar alguma idade, os mantos de àgua não são tão variados ou bonitos como os do TP, nem tão vastos o algoritmo das sombras foi simplificado e a estranheza de algumas animações serem accionadas não foi resolvida (o boneco ainda se move horizontalmente para a posição onde a acção se desenvolve, quando a abrir portas e/ou comprar poções) simplesmente alteraram o angulo da camara para não ser tão gritante. É um jogo que tirando a reformulação gráfica (e o muito bonito filtro “impressionista”) não perdeu muito tempo na tecnologia “gráfica” e por isso começa a exibir algumas rugas, não obstante de a engine o ter beneficiado enormemente, a implementação passada de twilight world, os ataques circulares da midna e as quests de coleccionar light orbs são claramente re-utilizadas num ou noutro contexto mais ou menos óbvio, pelo que uma das razões pelas quais o jogo consegue ser tão cheio é sem dúvida o facto de no seu grau mais básico, estar para o TP como o Mario Galaxy 2 está para o Mario Galaxy (sem querer estar a ser redutor, porque de um ponto de vista estrutural, como referido acima, é o jogo que mudou mais coisas desde o OoT e será lembrado por isso). A fragmentação do jogo também é uma pena, especialmente em skytown, saltar da cidade e chamar o Loftwing (os pássaros) tem uma transição, com a duração de entrar e sair de uma casa, mas é uma transição, num espaço aberto, isso faz com que as aterragens na cidade sejam “scripted” e podem apenas ser feitas em meia dúzia de locais.

Uma ressalva a ser feita é que sabendo que a wii é capaz de fazer 3D-estereoscópico (e que este foi usado internamente no Luigi’s Mansion da GC e no Mario Kart wii) este jogo parece ter as cutscenes claramente pensadas com 3D estereoscópico em mente, depois de jogar o Ocarina of Time e tomar consciencia dos angulos que maximizam o efeito, é identificável no SS que quase todas as cutscenes têm 2 a 3 planos muitos delimitados visiveis, e os angulos escolhidos são estratégicos, parece-me óbvio que a equipa já estava a pensar em 3D estereoscópico num Zelda, o que são boas noticias para um Zelda 3DS e quem sabe, para um Zelda na wii U.

A animação nas cutscenes está eximia, e este é o primeiro Zelda a ter cutscene models francamente mais detalhados que os seus congéneres “normais”, basta olhar para os dedos dos mesmos. E a implementação de cell shading está óptima, como seria de esperar da equipa que fez o wind waker. Também é de louvar o grau extra de expressões e animações faciais com que a equipa dotou o link. A direcção artistica é decerto melhor que a do TP e irá sobreviver melhor à passagem do tempo, não obstante de ser menos impressionante de um ponto de vista técnico. As chamas também merecem a ressalva de serem muito bem feitas (e na sua variante verde em particular lembra as chamas verdes da Maleficent na Bela Adormecida, dado que o jogo tem uma direcção artistica cartoony não vejo que melhor elogio posso fazer do que me ter feito lembrar um dos melhores filmes de animação clássica)

O sidekick neste Zelda falha em se humanizar por aí além ao longo do jogo, um “backup” da consciencia da Hylia (personagem mitica introduzida no jogo) teria sido bem mais interessante. Cumpre sobejamente o seu papel (só se torna chato a avisar que as pilhas estão vazias), mas não “encaixa” sendo por isso o único ponto passivel de ser classificado como um pouco ôco. Depois da midna, é um grande passo atrás, até na forma como a sua fala soa que é sempre um pouco estranha e ao contrário da Midna, soa um pouco demais a algo asiático e é uma pena o standard monocórdico.

Falar do sidekick lembra-me também da velocidade do texto, em Zeldas anteriores carregar em A fazia dialogos “normais” ou repetidos aparecerem na sua totalidade permitindo fazer skip para a próxima mensagem mais rápido e isso está ausente. Sendo o que o sidekick diz quando invocado sempre a mesma coisa a demora torna-se um factor demotor à utilização do sistema, e referente a NPC’s inicialmente algo que quebra o pacing.

O audio é na sua maioria caracteristico Zelda, não há melhor elogio a ser feito. A ter de ser criticado, digo no entanto que se achei a theme music do TP a melhor de sempre na sua altura, não considero que o SS a tenha suplantado (o mesmo para a theme do title screen) apesar da redenção ser a Zelda Theme invertida o que é impressionante. Não para dizer que devem ser comparados assim, como em todos os Zeldas a música é diferente e tem uma personalidade distinta, e as raizes escolhidas são variadas. A ter de as identificar, algumas musicas associadas à Fi aparecem-me como claramente irlandesas ao empregarem gaitas de foles, ao mesmo tempo que toda a banda sonora parece ter, nem que seja num momento ou noutro instrumentos de sopro claramente delimitados (ou ecoados), acredito que a tal se deve a orquestração e o facto de instrumentos de sopro serem os mais beneficiados em personalidade pela mesma. Noutra nota, a música do ambiente circundante de Skyloft é decididamente inspirada por obras “épicas” como a música do Jurassic Park de John williams e as “chilling theme’s” parecem tiradas dos save rooms de um Resident Evil, são algo que não creio ter presenciado antes em Zelda, a terem de conter um sentimento diria serem esperançosas, mas não épicas e isso torna-as mais pessoais, nas linhas de introspectiva. É positivo. 

Também a componente videojogável musical do jogo é competente e vai de encontro a como a batuta do ww seria utilizada com motion controls, continua a não ser um substituto da ocarina, no entanto e a sua implementação lembra algo retirado do wii music.

Em tom de conclusão, este jogo é um marco para a série e para os prospectos do Motion Control como algo que adiciona à experiencia. Só não ganha, para mim, o prémio de melhor jogo do ano para a consola é pelo simples facto de o Xenoblade Chronicles existir e conseguir ser mais ambicioso, mas comparar dois jogos deste calibre não é justo. Os únicos pontos a assinalar neste reinventar da fórmula é mesmo o facto de muitos deles poderem ser melhor feitos em versões subsequentes, e decerto irão, mas é essa margem de coesão guardada para jogos futuros ao ser transparente impede-me de lhe dar uma nota perfeita. Bravo Nintendo, Aonuma e Fujibayashi (o novo director) esta itineração trás muito de novo e reinventado, e não obstante de ter perdido tanto tempo neste como no Zelda TP, este jogo parece ter facilmente o dobro do conteudo e variedade do mesmo, com balanceamento eximio.

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