Análises

Hotline Miami 2: Wrong Number

Versão testada: PS4

Originalmente planeado como uma expansão do primeiro Hotline Miami, Wrong Number revelou-se um projeto demasiado ambicioso para se tornar apenas num complemento do que existia. Se há partida se pensa que pouco mais se poderia fazer com um jogo tão peculiar, mas que resultou de forma excelente, os produtores do jogo fizeram um esforço para tornar a experiência Hotline Miami diferente, mas familiar. O aspeto do jogo mais importante continua lá, portanto, a jogabilidade rápida, que exige reações instantâneas, que frustra, que provoca euforia, que nos deixa extasiados e sempre a desejar por mais acompanhados de uma bela música, fazem deste jogo uma aventura única.

A expectativa para esta sequela estava muito alta. Se por um lado havia o receio de termos mais do mesmo, não que no caso fosse mau, havia também o desejo de levar o jogo para caminhos mais alargados em algumas das suas componentes. Uma delas é a história. Quem jogou o primeiro jogo sabe que uma narrativa coesa e percetível não é algo que aqui tenha lugar, ainda assim foi feito um esforço para dar mais tempo de antena aos personagens que se interligam uns com os outros, tentando de alguma maneira ligar os pontos mais soltos para que se possa formar na nossa cabeça um mínimo de sentido. A aventura leva-nos até 1991, sendo que serão várias as vezes que andaremos a saltar no tempo e espaço para ter algum elemento do passado presente na nossa mente para assim perceber alguns dos acontecimentos atuais. Como foi dito encarna-mos várias personagens, ao invés de uma como no primeiro jogo. Cada uma tem a sua personalidade, e esta acaba por se refletir na jogabilidade, pelas boas e más razões. Não iremos ter mais Hotline Miami, segundo os produtores, e apesar da ambiguidade dá para ter algum sentido de conclusão na passagem dos créditos.

hotline miami 2 review 1Apesar das similaridades entre os dois jogos da saga seria um erro pensar que são iguais. Foram feitas mudanças deliberadas naquilo que é o jogo para o tornar diferente na igualdade. Explicando melhor, o foco de ambos os jogos continua o mesmo, ou seja, rebentar com tudo o que nos apareça pela frente e evitar ser atingido pelo que quer que seja, pois morremos num hit . O caminho que nos leva até esse objetivo foi sim mudado, mas não o resultado final, misturando combos, velocidade e ritmo para assim obtermos melhores pontuações. Em vez da frenética ação, quase sem paragens de sala para sala, que foi característica do primeiro jogo, aqui temos um ritmo mais pausado, muito fruto das novas decisões que foram feitas na construção de níveis. Dois exemplos: os níveis tem salas muito maiores, o que quer dizer que eventualmente poderão ser povoadas por mais inimigos, o que revela um dos primeiros problemas do jogo, pois a contagem de inimigos em certos níveis é gigante, tornando o jogo mais difícil do que deveria ser, especialmente no que toca aos nossos combos de mortes seguidas, pois com tantos inimigos e tão espaçados torna-se por vezes demasiado frustrante o progresso.

Em segundo lugar, e consequência também dos níveis maiores, acontece, demasiadas vezes, levarmos com tiros fora do nosso raio de visão, mesmo com a ajuda da mecânica de visão alargada, que nos permite ver mais além no nível, mas ainda assim é bastante comum não saber porque morremos. É certo que voltar à jogabilidade é instantâneo, mas não deixa de ser um problema que se torna demasiado evidente quando estamos em níveis que permitem que os inimigos nos vejam de bastante longe.

O jogo pareceu-me mais direcionado para o uso de armas de fogo, pois desde muito cedo temos que lidar com bastantes números de ameaças, ques têm armas de fogo também. Perdeu-se, na jogabilidade de momento a momento, um pouco de diversidade de pegar num taco e limpar um sala inteira e trocar constantemente de arma se assim o desejarmos. É, portanto, um jogo que envolve mais planeamento, por mais estranho que possa parecer, pois o caos que normalmente fica após a nossa passagem é devastador.

hotline miami 2 review 2Estas questões são de alguma forma, não toda, ultrapassadas desde que nos mentalizemos que estamos a jogar o segundo jogo e não o primeiro, não deixando elas de existirem. Dito isto, o jogo continua a ser uma maravilha de se jogar. Há sempre aquele momento em que tentamos e tentamos planear de todas e mais variadas formas ultrapassar uma sala que parece intransponível. Depois de muita frustração, muitos nomes chamados, há sempre aquele click onde deitamos toda e qualquer estratégia pela janela e vamos à maluca pelo nível a matar o que nos apareça pela frente, e sem dar por ela já limpamos a sala toda. A sensação que isto provoca no jogador é aquilo que é este jogo, ou seja, saber que morremos num hit, mas também matamos apenas num, e o constante êxtase de estar sempre em perigo tornam o jogo uma experiência fenomenal.

As máscaras que são tão importantes para diferenciar o tipo de jogabilidade continuam a acompanhar com as suas diferentes habilidades, se bem que em bem menor número. Mais uma vez o processo aqui é diferente, ou seja, ao invés de termos um personagem que usa várias máscaras, estas são única e exclusivamente de um, fazendo com que aquele individuo seja associado sempre à mesma. É uma ideia interessante, que de alguma maneira elimina redundâncias, mas ter apenas 4 máscaras, nos níveis onde nos é permitido escolher, parece-me pouco. Todas têm habilidades distintas, como um dodge, ou controlar duas personagens ao mesmo tempo, mas forçar, nos restantes níveis, a escolha a apenas uma, ou em casos nenhuma, torna a jogabilidade mais conservadora.
Seria um problema menor se depois de terminarmos o jogo pela primeira vez nos fosse dada a escolha de qualquer uma em todos os níveis, mas isso, surpreendentemente, não acontece, pois o maior ênfase dados aos personagens e às suas histórias não permite isso.

hotline miami 2 review 3O jogo continua com um aspeto fabuloso de pixel art. Todo o ambiente que transborda pelos cenários com as mais variadas alusões ao período dos anos 80/90 é exemplar e dão uma classe ao jogo invejável. Desta vez temos presentes mais alguns efeitos, nomeadamente efeitos climatéricos, que ajudam na atmosfera. Continua bastante visual o jogo, mostrando que não tem problemas em ser violento de todas e quaisquer maneiras, basta ver que uma das máscaras começa com um moto serra, e acho que poderão imaginar o resto.
Infelizmente sofre de alguns problemas técnicos, como inimigos presos nas portas, ou então cães a fazerem círculos num loop infinito. Não proporciona grandes problemas, mas por vezes pode facilmente resultar numa morte, pois a deteção de colisão dos nossos ataques, quando acontecem estas situações, não resulta muito bem.

Depois temos a banda sonora. Bem, a banda sonora… podemos começar por classificá-la: fenomenal, excelente, fora de série, estonteante, imensa, sublime, portentosa, espantosa, formidável, inigualável… podia fazer mais um parágrafo a continuar, mas deve dar para perceber a ideia. Já tínhamos sido brindados com uma OST como esta anteriormente, mas conseguir subir ainda mais a fasquia era algo que não esperava, resultando numa mistura eletrónica invejável. Carpenter Brut, M|O|O|N, Jasper Byrne, Magic Sword, Perturbator são apenas alguns dos artistas que trabalharam nesta banda sonora, sendo que alguns voltam do primeiro jogo. Não basta a qualidade das músicas mas a maneira como elas se encaixam nos níveis. A jogo deixaria de ser o que é, e ter o impacto que tem, se não tivesse este aspeto tão importante que é um dos pilares que o define.

A campanha é mais longa que o anterior, e encontra-se dividida por atos. Apesar de maior não se prolonga para além daquilo que deve e uma vez que é um jogo que se propõe a ser repetido várias vezes para melhorarmos a nossa pontuação, tem a duração certa. Ainda assim os produtores decidiram ir mais longe a adicionaram uma nova dificuldade. Hard altera a orientação dos níveis da dificuldade anterior, adiciona mais inimigos, retira a possibilidade de lhes fazer lock-on e torna a AI mais agressiva, tornando a experiência mais difícil, mas também, de alguma forma, refrescante e “nova”, trazendo assim mais incentivo para continuar a jogar depois de terminar a campanha. Infelizmente, uma das melhores ferramentas que foi anunciada para o jogo não faz parte do lançamento, o editor de níveis, que provavelmente prolongará a longevidade de forma substancial, dando à comunidade a oportunidade de criar os seus próprios níveis.

Hotline Miami é uma injeção de adrenalina, uma descarga de euforia e raiva que proporciona momentos únicos numa experiência videojogável. Esta sequela é mais focada, tenta abrir outros caminhos, e é sobretudo diferente apesar de partilhar muitos elementos comuns. Longe de ser a sequela perfeita, pois isso também seria impossível, esforçou-se por ser a sequela natural do que havia sido criado, e com sucesso. Não é para todos, mas se lhe for dada uma oportunidade pode ser que saiam surpreendidos quando o visual, a jogabilidade e o sonoro se conjugam de forma tão harmoniosa.

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