Análises

Sonic: Lost World (Wii U)

Ser fã do Sonic já teve dias mais fáceis, mas isso já foi há tanto tempo que às vezes é daquelas memórias que se confundem com sonhos. Ironicamente, ao tomar um caminho perigosamente perto do Super Mario Galaxy, Sonic: Lost World aproxima-se mais dos conceitos que marcaram os clássicos da série na Mega Drive. Abandonando pretensões de ser um jogo de Fórmula 1 com rasgos de jogo de plataformas e níveis repletos de caminhos alternativos, agora o ênfase parece voltar aos saltos e a velocidade, apesar de alta, está mais moderada.

Sonic-Lost-WorldSoa promissor, mas infelizmente a execução está longe de ser a melhor. Controlar o Sonic é como tentar agarrar um sabonete molhado, num momento ele está seguro e no outro escorrega-nos e cai com a maior das facilidades. Aqui o Sonic tem dois tipos de movimento, um lento onde não nos deparamos com grandes problemas e outro em que ele corre mais rápido ao carregar no ZR. A altas velocidades o ouriço tem um comportamento extremamente imprevisível, um ligeiro toque no joystick pode mandá-lo disparado para um mergulho no abismo quando queríamos ajustar a trajectória, ou então perdemos imensa velocidade apenas para virar uns graus.

Com o tempo aprendemos que o Sonic move-se de maneira diferente de acordo com o tipo de secção em que estamos: se ele está a correr automaticamente numa zona em tubo, em plano, a fazer grind em carris, se estamos a controlá-lo completamente ou claro, se estamos em 2D. Em conjunto com uma física nem sempre precisa, estas mudanças que podem acontecer de um momento para o outro, tornam o controlo do Sonic num exercício de probabilidades que leva a momentos de imensa frustração, especialmente porque não é raro haver situações em que o jogo se comporta de maneira completamente diferente de tudo o que aconteceu até ao momento sem grandes razões para tal.

Um dos maiores problemas é o lock-on: como tem vindo a ser habitual, uma retícula fixa-se automaticamente nos inimigos ao aproximarmo-nos deles, permitindo-nos atacar os alvos sem ter que fazer pontaria, sendo possível neste jogo fazer lock-on a vários inimigos ao mesmo tempo ou vários lock-on no mesmo inimigo para um ataque mais forte. A questão é que muitas vezes o lock-on não é feito, desaparece muito rápido ou tranca-se num inimigo que não queremos ou pior ainda, numa mola, forçando-nos a ir para lá quando atacamos, muitas vezes saindo da zona sem querer. Apesar de haver dois botões para saltar que fazem exactamente o mesmo, apenas o A serve para atacar quando o lock-on está feito, ficando o B para fazer um segundo salto, uma solução para quando queremos saltar em vez de atacar, mas uma que não é intuitiva nem devidamente esclarecida, o que nos leva a outra falha.

28106SONIC_LOST_WORLD_Wii_U_Screenshots_720p_1280x720_v1_6O jogo explica extremamente mal as mecânicas e os controlos, não só é fácil falhar as mensagens de ajuda que nos forçam a olhar para o Gamepad para as accionar, elas são insuficientes para entender relativamente bem o jogo. O novo sistema de parkour, que consiste na habilidade de subir paredes, saltar delas, agarrar-se a peitoris e saltar pequenos obstáculos não só beneficiava de uma melhor explicação como nem sempre funciona como desejado. Apesar do Sonic conseguir subir grande parte dos obstáculos, volta meia-volta aparece um que ele não sobe, uma plataforma a que ele não se agarra ou um salto de parede que não faz bem e mesmo quando o parkour funciona bem, poucas utilizações interessantes são dadas a esta mecânica.

Os níveis iniciais não estão mal conseguidos de todo apesar de ainda haverem demasiadas e longas secções em que o jogo basicamente se controla sozinho enquanto o Sonic corre e salta de um lado para o outro. Mesmo assim, são raras as vezes em que o design de níveis atinge momentos verdadeiramente interessantes, especialmente nas secções 3D e em parte devido ao lock-on, o jogador pouco mais faz do que lutar com os controlos, não havendo muitas partes genuinamente bem pensadas e divertidas ou saltos que exijam mais do que fazer lock-on numa mola ou saltar por cima de um obstáculo enquanto o Sonic corre sozinho. Já em 2D, há mais momentos “puros” de um jogo de plataformas, com mais saltos aliados à velocidade e mesmo sendo secções e níveis que mereciam bastante mais desenvolvimento, não deixam de haver alguns momentos interessantes. Felizmente a Sonic Team livrou-se dos níveis repletos de confusos caminhos alternativos e nada característicos para esconder os anéis vermelhos que os compleccionistas podem querer apanhar.

A segunda metade do jogo apresenta-nos níveis bem piores, que ao tentarem introduzir novidades, conseguem criar uma experiência ainda mais frustrante que me levam a questionar o que é que a equipa estaria a pensar. Como se já não houvesse elementos suficientes para tirar a paciência a um santo, o jogo dá pouquíssimas vidas, o que é piorado pelo facto de 100 anéis já não darem uma vida extra, algo que os torna inúteis para lá de nos permitirem sofrer um ataque. Não há nada como repetir vezes e vezes sem conta aqueles níveis mais insuportáveis.

originalNo fim de cada mundo temos os bosses, desta vez os Deadly Six, personagens que, vou arriscar dizer, foram criadas depois de um executivo qualquer ter dado ordens a meio do desenvolvimento para inventar uma bonecada para chamar os mais jovens. Isto até podia passar ao lado, mesmo os vários vídeos onde eles aparecem e que contêm diálogo claramente virado para as crianças podem ser passados à frente, mas as batalhas com eles são absolutamente terríveis, sem qualquer ilusão de desafio e que podem acabar numa questão de segundos. Permitindo-me especular um pouco mais, até é possível ver nos bosses o que provavelmente seria o boss criado inicialmente antes do aparecimento dos Deadly Six, visto que em quase todos os níveis finais ou batalhas vemos um robô que salta à vista e estranhamente passa para segundo plano.

De volta do Colours estão os Wisps que nos conferem vários poderes temporariamente, como por exemplo a capacidade de voar ou perfurar a terra a altas velocidades. Se por um lado o facto dos níveis já não terem demasiados caminhos faz com que os Wisps não quebrem tanto o ritmo de progressão dos níveis, por outro eles são completamente inúteis. Não só não trazem nada digno de nota ao jogo, sendo muitas vezes preferível evitá-los, como alguns têm controlos por movimento obrigatórios, mal explicados e que funcionam mal. Por várias vezes tive que desistir de um nível por não conseguir apontar o Wisp foguete. Além disso, é obrigatório o uso do Gamepad, o que não tem nada de mal, mas seria bem-vinda a hipótese de controlar o jogo com o comando Pro visto que os controlos por movimento são péssimos e seria facílimo criar uma alternativa, tanto é que alguns poderes têm-na.

Nem tudo é mau, os gráficos e a direcção artística são óptimos, com um estilo menos detalhado do que o Generations e que na minha opinião se adequa bastante melhor, os níveis estão muito bonitos, cheios de vida e cor, parecendo alguns uma boa evolução dos clássicos e os modelos dos inimigos, grande parte deles versões 3D dos Badniks que conhecemos e amamos da Mega Drive, estão extremamente bem feitos e carismáticos. A acompanhar isto está uma banda sonora fantástica, dirigida por Tomoya Otahni que compôs uma grande variedade de óptimas faixas com diversos estilos, com influências ska como tem vindo a ser costume, mas também de música Francesa, Brasileira e muitas outras.

28104SONIC_LOST_WORLD_Wii_U_Screenshots_720p_1280x720_v1_4De cabeça fria e com a paciência de um monge Budista, dei uma segunda hipótese ao jogo e joguei todos os níveis várias vezes. Habituando-me aos controlos como um condutor se habitua a um carro que alterna magicamente entre estar bem, não ter direcção assistida, ficar com um pneu careca ou ter o eixo desalinhado, nem tudo foi tão mau como a primeira vez, aquela que mesmo sendo estranha, é suposto ser especial. Saber os jeitos do carro ajudou-me a passar os níveis com menos momentos propícios à criação de úlceras, havendo até alguns níveis engraçados de fazer time attack, mas no fim, depois de me fazer sofrer 7 horas com as suas falhas, fiquei com um jogo que não encoraja tomar riscos e experimentar, que anda entre o inofensivo e o insuportável com algumas viagens ao bom, mas não as suficientes.

É triste ver como o Sonic: Lost World acabou, a equipa virou-se na direcção certa, mas ao tentar dar um passo, tropeçou e caiu. Apesar dos gráficos e música serem de topo e de alguns níveis nem serem maus de todo, a execução falha ao nível mais básico, não conseguindo um sistema de controlo e física que se comportem suficientemente bem.

Certas pessoas, nomeadamente para aqueles que ainda são fãs, talvez sejam mais tolerantes das falhas desta versão do Sonic: Lost Worlds, mas para mim, foi uma experiência que não posso recomendar.

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