Análises

Cyberpunk 2077

Sobreviver em Night City

A CD Projekt Red regressa com um título de enorme potencial rebaixado por demasiados problemas.

Versão testada: Xbox One (a correr via retrocompatibilidade na Xbox Series X)
Disponível para: PC, PlayStation 4, Xbox One

Sete anos depois de ter sido oficialmente anunciado e de ter sofrido alguns adiamentos, chegou finalmente a hora. Cyberpunk 2077, o muito aguardado novo projecto do conceituado estúdio CD Projeckt Red, chegou ao PC, PlayStation 4 e Xbox One. Porém, aquele que deveria ter sido um momento de enorme satisfação e diversão, tornou-se num momento de muita frustração e desilusão. Tal como o jogo final, esta análise será de extremos completamente opostos.

Mas vamos por partes. Cyberpunk 2077 é um action RPG na primeira pessoa, cuja acção decorre em Night City, uma megalópole obcecada com poder, glamour e alterações de corpos. Aqui, os jogadores seguirão as pisadas de V, um mercenário que persegue um implante essencial para obter a imortalidade. Como existe um grande foco na narrativa, estou propositadamente a ser pouco especifico para não estragar a história a ninguém, especialmente quando é um dos melhores aspectos do jogo. Escusado será dizer que as coisas nunca são tão simples como aparentam e que raramente correm como planeado. No decorrer da aventura, o jogador irá conhecer muitas personagens e terá de escolher o seu caminho, estando ciente de que as suas decisões podem ter consequências.

O ponto forte da Cyberpunk 2077 é a campanha e a sua alma tem um nome: Johnny Silverhand, interpretado pelo inconfundível Keanu Reeves. Ao início, esta personagem e a forma como Keanu escolheu entregar as suas linhas de diálogo pode parecer algo estranha, pouco natural, mas há medida que a história avança e vamos conhecendo melhor esta personagem, as coisas começam a fazer sentido e entende-se o porquê da direcção escolhida. O prólogo termina após cerca de meia dúzia de horas e a partir daqui, o jogo abre mais e mostra que a escala deste projecto era muito ambiciosa. A nível de design e de ambiente, Night City é excelente e um dos melhores mapas de jogos open world dos últimos tempos. A campanha em si não é muito longa, podendo ser terminada em 25 horas, mas existe muito conteúdo em Cyberpunk 2077 para estender o tempo de jogo por mais umas quantas dezenas de horas.

Mas antes de entrar na aventura, há que escolher o tipo de background da nossa personagem. Estão disponíveis três life paths, cada um com a sua própria introdução/missão. Estes life path não mudam por completo a experiência ao longo da campanha, mas funcionam de forma semelhante ao Mass Effect, na medida em que abrem novas linhas de diálogo ao longo de todo o jogo. Isto é evidente logo desde as primeiras horas. Eu comecei com o Corpo life path, e durante a conversa inicial com o Dexter DeShawn, V debita informação que de outra forma dificilmente teria maneira de saber. Ainda assim, parece-me que o life path default será Street Kid, tendo em conta a forma como V fala e se comporta, mas qualquer um pode ser utilizado sem consequências tão punitivas como acontece, por exemplo, na escolha da origem em Divinity Original Sin 2.

Sendo este um jogo com um enorme foco na narrativa, o voice acting não foi descurado. Joguei em Inglês, como habitual, e no geral, todos os actores fizeram um bom trabalho a encarnar as suas personagens. Pessoalmente, achei a voz feminina de V melhor, mas qualquer um dos actores fizeram um bom trabalho. A banda sonora é outra área onde o jogo brilha, apresentando uma mistura de géneros, incluindo jazz, hip-hop, metal, industrial e rave, sendo que, por vezes, nota-se uma inspiração em Deux Ex e Blade Runner. E em algumas alturas de acção, a banda sonora bate forte e consegue acentuar ainda mais essas cenas frenéticas, criando momentos marcantes. Para ser brutalmente honesto, o jogo em si não inova grande coisa nem empurra o género para a frente, mas onde consegue destingir-se é na qualidade da campanha, nas personagens interessantes, na excelente banda sonora e no design do mundo.

A nível de jogabilidade, os duelos são uma mistura de stealth, hacking, lutas corpo-a-corpo e tiroteios. A vasta maioria das situações de combate podem ser abordadas de qualquer uma destas formas. Eu preferi focar-me em armas de fogo e hacking, e com as habilidades e equipamento certos, chega a ser possível ver onde estão todos os inimigos e disparar através das paredes. As armas corpo-a-corpo também são bastante fortes, e com uma build bem optimizada, diria que chegam a ser mesmo muito fortes. Stealth talvez seja a abordagem mais complicada de usar devido à IA e a forma como o sistema de detecção funciona, precisando de mais trabalho para ser igualmente viável. De qualquer das formas, uma vez escolhido o tipo de abordagem preferido, o ideal será os jogadores focarem-se nos atributos e habilidades que beneficiam esse estilo, de forma a terem acesso a habilidades mais fortes.

Até aqui, Cyberpunk 2077 é aquilo que se esperava. A história é bastante boa, o ambiente e o tipo de situações colocadas ao jogador são algumas das melhores dentro do género e há também que ter em conta a forma como algumas decisões nas quests podem resultar em desfechos inesperados. No entanto, é impossível não reparar na panóplia de problemas que afligem o jogo, especialmente nas consolas. Não reparar na quantidade de bugs, alguns que até podem causar a perda de progresso, seria o mesmo que não reparar em alguém vestido de amarelo florescente a andar na rua com um megafone na mão a fazer barulho. Jogar Cyberpunk 2077 neste momento é como ver um bom filme com bloopers pelo meio. Quer queiram quer não, os bugs vão fazer-se notar.

Todos os jogos têm bugs, especialmente os jogos open world no lançamento, mas Cyberpunk 2077 é um caso extremo. Atrevo-me a dizer que este jogo, neste momento, está em Acesso Antecipado. O leque de bugs que encontrei no meu tempo em Night City inclui bonecos a deslizar ao invés de andar, bonecos a trespassar portas, bonecos a fazer t-pose (incluindo em veículos), bonecos a pairar metros atrás dos carros que estão a conduzir, carros a serem projectados sozinhos, carros enfiados uns nos outros e a serem atirados para o ar, UI a dar informação errada, elementos da UI uns em cima dos outros, e armas invisíveis. Cyberpunk 2077 é um dos jogos com mais bugs que joguei nos últimos anos, o que não deixa de ser surpreendente tendo em conta os valores de produção e todo o marketing em torno deste título. Desde o lançamento já foram lançadas algumas actualizações que melhoraram alguns aspectos, mas também adicionaram novos bugs, como NPC’s a caírem através do chão e carros a voar.

Mas não são só bugs. A performance de Cyberpunk 2077 na PS4 e Xbox One é abismal. Relembro que este jogo foi anunciado para estas duas plataformas, como tal, não existe grande desculpa para a performance nestas consolas baixar dos 20 FPS durante longos períodos de tempo ou para existirem paragens de 1 minuto para carregar os assets. Cyberpunk 2077 não é o primeiro jogo open world nestas plataformas. Aliás, nem é o primeiro jogo open world lançado nos últimos meses. Eu joguei a 60 FPS na Xbox Series X em modo retrocompatibilidade sem ter notado problemas de fluidez e o mesmo também é possível na PS5. Quem tiver um bom PC ou tiver a sorte de ter adquirido uma consola de nova geração terá uma experiência razoável, mas quem quiser jogar Cyberpunk 2077 nas consolas da geração passada não terá uma experiência de jogo particularmente boa.

Além disso, e talvez mais importante, existem dois aspectos fundamentais na construção do mundo que precisam urgentemente de serem melhorados. O primeiro está ligado aos NPC’s. Originalmente, a CDPR tinha dito que existiriam milhares de NPC’s com as suas rotinas diárias próprias, tornando assim a cidade mais viva e dinâmica. Esse não é o caso. A cidade está bem mais vazia do que tinha sido dado a entender, além de que a IA dos pedestres é bastante básica e tem falta de interactividade, e a dos condutores nem reconhece a presença do jogador no seu caminho. O outro aspecto está ligado à polícia. Em 2019, a CDPR disse que a polícia poderia tornar-se corrupta e ser subornada por corporações. Não só isso não está presente, como a polícia aparece do nada em redor do jogador, algo que a produtora tinha dito que não iria acontecer. Estas coisas combinadas fazem com que o aspecto open world e a credibilidade desta cidade sejam apenas uma fachada que se desmorona assim que se olha mais atentamente.

Depois, existem alguns aspectos menores que poderão mais facilmente ser corrigidos ou adicionados num futuro próximo. Por exemplo, não existe qualquer tipo de personalização de veículos, algo que estava previsto estar presente, e também não existe qualquer sistema de personalização de roupa de V, ou seja, o aspecto da personagem está ligada ao equipamento usado. Inclusive, nem é possível alterar o visual de V, como alterar o penteado, coisa que era possível em The Witcher 3. A UI precisa igualmente de alguma atenção, porque por vezes sobrecarrega o jogador com demasiada informação e o mapa é desnecessariamente confuso e não permite seleccionar que ícones mostrar e esconder.

Prefiro focar-me mais nos aspectos positivos dos jogos que me caem nas mãos, mas Cyberpunk 2077 dificultou imenso conseguir fazer isso, porque o núcleo de jogo é bom, por vezes até muito bom, mas está escondido por debaixo de uma enorme camada de bugs e problemas técnicos impossíveis de não reparar. Quando o jogo funciona bem consegue oferecer momentos fantásticos; consegue oferecer os momentos que os fãs tanto esperaram durante anos e a campanha é surpreendentemente boa, mas mais vezes que o ideal, o jogo não funciona bem e, inevitavelmente, as falhas, bugs e problemas de performance surgem para estragar a magia. E é isto que torna frustrante jogar Cyberpunk 2077 neste momento. No futuro voltarei a Night City quando as versões PS5 e Xbox Series X|S forem lançadas, mas por agora, é uma enorme desilusão o estado em que este jogo com tanto potencial foi lançado.

Nota editorial: Cópia fornecida pela editora para efeitos de análise.

Veredito

Nota Final - 6

6

Cyberpunk 2077 é um título com um enorme potencial mas que, de momento, está cheio de bugs e problemas técnicos, e se não o puderem jogar num bom PC ou numa consola de nova geração, a vossa experiência não será a melhor.

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