Análises

The Elder Scrolls Online

The Elder Scrolls Online é o tipo de jogo acerca do qual nunca haverá opiniões unânimes. Para começar, há a sua natureza dupla como esforço para encaixar ao mesmo tempo em duas categorias diferentes, tentando agradar a dois públicos que não serão necessariamente compatíveis. Ou seja, estamos perante o mais recente jogo da saga Elder Scrolls, com todas as expectativas que isso acarreta, e, em simultâneo, estamos perante um MMO, com as expectativas que isso acarreta e que não serão menores. Resulta desta bicefalia potencialmente paradoxal um imbróglio de difícil resolução: a tribo Elder Scrolls esperava uma versão aprimorada de Skyrim adaptada ao formato multijogadores enquanto os irredutíveis dos MMO esperavam um jogo que pegasse no formato atirado para a ribalta por World of Warcraft e satisfizesse todas as exigências do género.

Como resultado inevitável, estes dois públicos sairão inevitavelmente desiludidos. Porque os constrangimentos técnicos e a estrutura MMO dificilmente permitiriam criar um Skyrim multijogadores e porque a fidelidade aos pergaminhos Elder Scrolls, passe a redundância, jamais seria compatível com um MMO puro. Isto não significa, porém, que o resultado seja um fracasso. Porque, para sorte da Zenimax, os jogadores que não encaixam de forma rígida e exclusiva nestes dois segmentos serão sempre maioritários. Para esses, para a maioria que não estava impedida à partida de apreciar The Elder Scrolls Online, resta analisar o jogo pelo que é e não pelas exigências impostas pelo género e pelo título.

TESO review screenshot 1Como em qualquer RPG, a progressão alcança-se por intermédio de quests obtidas em conversa com NPC. Nota-se um esforço óbvio para escapar à banalidade da receita “matar X criaturas do tipo Y, voltar ao NPC e receber a incumbência de matar X criaturas do tipo Z” e esse esforço dá frutos visíveis. Mesmo que estejamos a fazer exatamente o mesmo tipo de coisas, tudo fica agradavelmente coberto por uma camada de relevância narrativa que acaba por conferir significado à mecânica repetitiva. Pode acontecer, por exemplo, que um pedido para visitar determinado local ou para obter determinado item desmascare uma conspiração e desencadeie missões sucessivas para travar um plano malévolo. Não é revolucionário, mas é uma tentativa de resolver a monotonia do processo de grinding que consegue quase sempre atingir o objetivo.

Mas sentirmos que fazemos algo por um motivo válido não ajuda a tornar mais interessantes as personagens que vamos encontrando pelas vastas extensões de Tamriel, verificando-se uma insipidez generalizada, sem grande esforço de caraterização ou diferenciação e com as vozes dos mesmos dois ou três atores, que, em conjunção com a animação tantas vezes deficiente dos grandes planos ativados sempre que falamos com alguém, arruína o realismo que se desejava.

A ação tenta conjugar o sistema tradicional de hotkeys com uma vertente mais posicional com sucesso relativo. Os ataques principais dependem de cliques do rato, com um botão a controlar golpes simples e longos e o outro a controlar o bloqueio. Cada combate pode alternar momentos em que se sente uma certa fisicalidade dos ataques com outros em que mais parece que estamos a golpear o ar, mesmo quando atingimos o alvo. Neste sentido, o combate aproxima-se muito dos jogos Elder Scrolls, mas isso não será necessariamente positivo. Além dos ataques com a arma de eleição, existe uma action bar com apenas cinco skills, manifestamente pouco para um jogo que permite uma versatilidade tão grande na construção da personagem, reforçada por uma tecla para consumíveis e outra para uma skill especial. Não se enquadraria no jogo uma action bar com dezenas de skills, como encontramos noutros MMO, mas talvez pudesse esperar-se um pouco mais.

Como se disse acima, uma das maiores forças de Elder Scrolls Online é a liberdade na construção da personagem. Existem apenas quatro classes, que correspondem por alto aos arquétipos do género, mas, depois de feita a escolha inicial, é perfeitamente possível orientar a progressão da forma que bem entendermos. Um sorcerer pode tornar-se especialista na utilização de armadura pesada, um dragon knight pode tornar-se healer. Bastará para isso gastar os skill points obtidos com as subidas de nível, tal como sucedia em Skyrim, mas não se aconselha uma dispersão demasiado grande para evitar personagens desequilibradas com talentos múltiplos e incapazes de se destacarem em qualquer um dos papéis.

O sistema crafting é outro aspeto que evoca Skyrim, sendo possível procurar ingredientes num número de gavetas, armários, caixas e barris surpreendente num MMO mas sem se aproximar do que sucedia no último jogo single player da saga, e evoluindo-se pela experimentação constante na mistura de elementos. Não fosse o quase constante esgotamento de espaço de inventário e as inevitáveis deslocações ao banco e aos mercadores e estaríamos perante um sistema quase perfeito.

Estranhamente, a vertente multijogadores apresenta problemas surpreendentes num jogo em que deveria ser precisamente essa a vertente principal. Se a área de PVP, Cyrodiil, consegue aguentar-se pelos seus próprios méritos numa batalha eterna pela conquista de terreno (um pouco à semelhança do que sucede com o PVP de Guild Wars 2), é nas áreas PVE que ocorrem fenómenos algo embaraçosos. Por exemplo, é comum entrar numa área de missão enquanto outros jogadores enfrentam o inimigo principal e descobrir que, quando este é derrotado, partilhamos o mérito pelo triunfo mesmo sem termos feito nada. Poupa-se trabalho, é verdade, mas será que a poupança e o sentimento inevitável de nos ter sido roubada a ação agradará a alguém?

TESO review screenshot 3Graficamente, estamos muito longe de ter um jogo de visual tão impressionante como Skyrim. De igual forma, os gráficos também não conseguem alcançar o nível de MMO como TERA ou mesmo Guild Wars 2 (com as óbvias diferenças de estilo), ficando-se pelo adequado e erguendo-se muito ocasionalmente acima disso. As áreas de Tamriel são extensas, mas depressa se percebe que a variedade não abunda. Dir-se-á que será um toque de realismo, já que as paisagens reais não serão sempre dramáticas ou soberbas, e isso talvez convença muitos jogadores. Outros considerarão que se tratará de falta de esforço criativo. Compensando a sensaboria visual, o som é um aspeto em que não haverá grande coisa a apontar (além da já referida repetição das vozes e interpretação pouco emotiva), com uma banda sonora que poderemos qualificar sem grandes exageros como épica.

Será inevitável fazer uma referência à lamentável decisão de incluir uma décima raça (os imperials) e a possibilidade de escolher livremente a fação de cada raça apenas numa edição especial mais cara. Compreender-se-ia esta política num jogo free to play ou num MMO sem subscrição, mas, num jogo pago e com mensalidade, revelará algum desrespeito pelos jogadores pedir ainda mais dinheiro por funcionalidades que não são apenas cosméticas. Acrescente-se ainda o cavalo incluído na edição especial, essencial para superar as deslocações penosas pelos ambientes vastos e que só pode ser adquirido dentro do jogo por quantias que roçam o absurdo.

Com a pesada incumbência dupla de criar um MMO popular e de construir o novo jogo da saga Elder Scrolls, a Zenimax conseguiu não se estatelar ao comprido, como alguns previam, mas também não conseguiu o brilharete que tantos esperavam. The Elder Scrolls Online é uma transposição competente do universo Elder Scrolls e um MMO de boa qualidade. Mas, com Skyrim ainda tão presente e com concorrência tão forte no género, qualquer coisa abaixo de “memorável” defraudaria expectativas. E, com  as suas qualidades e defeitos, não se poderá dizer que estejamos perante um jogo memorável.

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